quarta-feira, junho 24

Blog do Bob Fernandes » Ninguém escreve ao Coronel

Bob Fernandes Direto de Johannesburgo (África do Sul)
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De capuz, na gélida tarde, a imensa solidão do Coronel Nunes pós sincericídio
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Uma dificuldade enorme escolher o título nesta quarta-feira. Por tudo que se viu ao longo do dia e no trajeto de bits e telefonemas entre a sede da CBF no Brasil e a seleção aqui em Johannesburgo, a escolha óbvia seria o clássico de Gabriel Garcia Márquez:
-Ninguém escreve ao Coronel.

O Coronel, no caso, é Antonio Nunes, Chefe da Delegação Brasileira na Copa das Confederações. Nunes, como se viu aqui neste blog ontem, cometeu um sincericídio. Disse, sem meias palavras:
-..Se a Copa das Confederações é um teste, eu não aprovaria a Copa do Mundo na África do Sul…a cidade tem toque de recolher às seis da tarde…à noite não se vê vivalma nas ruas…

E por aí afora.

Da obra de Garcia Márquez certamente se poderia surrupiar o título, mas uma adaptação, quiçá, seria mais indicada para o pós do Coronel Nunes. Talvez, "Ninguém Contesta o Coronel".

Sim, sabemos que a CBF lançou uma nota oficial (leia) para desautorizar o Coronel. Pela agência EFE, antes de tudo e todos, porque era necessário estancar rapidamente a sangria. Ordem direta de Ricardo Teixeira, o presidente da casa.

Na nota, que serve basicamente para desautorizar o Coronel, se diz, em muitas palavras, que não-é-nada-disso, deixa-disso, essa-não-é-nossa-opinião etcetera. O texto se refere quase sempre ao extremo cuidado e às ótimas condições à disposição da seleção.

Quanto a isso, o acolhimento ao time, nada ou quase nada se pode contestar. Mas também não se pode refutar facilmente muito do que disse o Coronel sobre os graves problemas de segurança em uma cidade como Johannesburgo.

Ao que dizem a Cidade do Cabo não tem tais problemas. Se o Brasil passar pela África do Sul amanhã, veremos.

Tal problema, segurança, não houve em Bloemfontein, primeira parada do Brasil. Lá, como vimos aqui outro dia, o Coronel falou pela primeira vez. Para saudar o prefeito da cidade, Mister Playfair.

Disse então, resumidas as muitas palavras, que Bloemfontein é uma cidade que jamais havia sido notada no mundo, que ninguém jamais tivera notícia de sua existência, mas que com a passagem estelar da seleção o nome da urbe seria catapultado para todo o mundo.

Seja com ninguém escrevendo para ou contestando o Coronel, fato é que Nunes viveu nesta quarta um dia de grande solidão. Se por caso ele tem algum longevo, freudiano problema de rejeição, essa gélida noite será duríssima.

Pela manhã, hora do almoço, o Coronel esteve, em companhia de amigos e de Jean Pierre, integrante da seleção verde-amarela, no Shopping Nelson Mandela, vizinho ao local onde reside o showman, o grande Joel Santana, treinador da Bafana, Bafana.

Ali, quase aos pés da estátua do patriarca Mandela e ainda sem ter sentido todas as conseqüências do seu sincericídio (leia aqui), o Coronel Nunes teceu mais algumas abalizadas opiniões sobre o candente tema da segurança (leia também aqui e aqui).

Discorreu então sobre o furto de uma grana, no Hotel Centurion, em Pretória, onde se hospedou a seleção. Como sabemos, levaram algum do fisioterapeuta Odir e teriam levado também do lateral Kleber.

Os detalhes das revelações de Nunes poderemos ler amanhã nos jornais O Estado de S.Paulo e Jornal da Tarde, mas, em resumo, o que o homem de armas informou foi que o hotel tentou um acordo antes que Dunga contasse a história numa entrevista.

O Hotel tentou um acordo para matar a história, mas quis pagar a Odir menos do que tinha sido furtado. Dito isso o Coronel comeu alguma coisinha no Shopping Mandela e rumou para o Ellis Park, para o treino vespertino.

Uma solidão comovente, a do Coronel no Ellis Park.

Houve quem, na bancada isenta, imparcial e objetiva - a dos jornalistas -, se dispusesse a atravessar o gramado para hipotecar solidariedade ao Coronel e trocar mais algumas palavras. A Diretoria de Comunicação não permitiu.

Tarde gelada, ventinho cortante, e Nunes sozinho no banco de reservas, com seu capuz erguido. Apenas o Diretor, Rodrigo Paiva, achegou-se ao banco e ao Coronel num certo momento.

Não foi possível saber do que trataram. Mesmo uma especialista em linguagem corporal não conseguiria perceber com exatidão o que significavam o Coronel e seu Capuz e os braços de Paiva a subir e descer no complemento do ideário exposto.

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Paiva, o Diretor de Comunicação, comunica ao Coronel
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De qualquer maneira, seguro é que o Coronel para cá veio como prêmio de consolação. Belém perdeu uma das vagas como cidade-sede para a Copa 2014 e a CBF de Teixeira enviou-o à tão temida savana africana como um bálsamo.

Visto a dimensão do caso, houve uma blitz da revista Terra Magazine, editada pelo blogueiro, em busca de informações sobre quem seria mesmo o Coronel Nunes.

Antonio Carlos Nunes de Lima, 70 anos – os cabelos negros jamais fariam supor -, nasceu na paraense Monte Alegre. Foi Chefe da Segurança Pública no Pará, comandou o quartel em Santarém e foi alcaide em sua cidade natal.

Já na reserva elegeu-se deputado estadual pelo PRN de Fernando Collor e, desde 1998, preside a Federação Paraense de Futebol.

No ano passado, é digno de registro, o Coronel Nunes foi homenageado com a outorga da comenda do Mérito Legislativo "Newton Miranda". Galardão este proposto pela conterrânea Josefina do Carmo.

Em que pese todo o esforço jornalístico, até o fechamento desta edição ainda não sabíamos com precisão a que arma pertence o Coronel Nunes.
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Foto: Reinaldo Marques/Terra